Nada mudou
O noticiário agora é pesadamente colocado sobre a
Copa do Mundo. A maior parte das noticias são sobre a competição. Outros fatos
são postos a margem dos acontecimentos e das páginas dos jornais. Se um
marciano pousasse por aqui, ele provavelmente iria se surpreender com o foco
das atenções, totalmente voltados para a Copa. Seria como se mais nada
estivesse ocorrendo.
Mas a verdade nua e crua é que a vida continua, na
maior parte cruel e inclemente como sempre foi, planeta afora. A pior parte que
se pode ver no noticiário está ocorrendo neste exato instante no Oriente Médio.
Depois de muita confusão, desculpas esfarrapadas, etc, o governo americano quer
ficar bem longe dos problemas do Iraque. Enquanto isso, toda uma guerra civil está
a ocorrer em uma região já bastante castigada por conflitos. No Iraque, da
década de 80 para cá, ocorreram guerras, invasões, rebeliões, etc. Isso sem
contar com o tal envenenamento coletivo na década de 70 causado por inseticidas
a base de mercúrio que tinha sido usado em sementes de trigo. Junte-se a isto
governos intolerantes, conflitos religiosos, tropas de ocupação estrangeira,
etc. e o que fica é uma situação de altíssima instabilidade política. O
combustível desta instabilidade sendo o petróleo, do qual o Iraque tem uma
grande parte das reservas mundiais.
A principal vítima de toda esta estória sem fim é a
população civil que localmente parece estar vivendo em um conflito sem fim. Não
importa quem está sendo vitorioso pois pouca diferença faz ser atingido pelas
balas da facção A, B ou C. Na atual situação, são xiitas contra sunitas (duas
correntes islâmicas). Antes era a invasão americana do Iraque, invasão
iraquiana do Kuwait, retomada do Kuwait, guerra Irã-Iraque, bombardeio por armas
químicas da própria população e assim por diante. Difícil não imaginarmos o que
acontece fora dos jornais tais como assassinatos, estupros, órfãos abandonados,
etc. A destruição da infraestrutura local deixando o pais depauperado e todo um
povo a mercê dos acontecimentos.
Apenas para lembrar: foi no Iraque, que conhecemos
nos livros de história como Mesopotâmia (entre rios em grego), que a
civilização surgiu muito tempo atrás. O primeiro império digno do nome foi o do
rei conhecido como Sargão. Abraão era desta região antes de emigrar para a
Palestina. A narrativa da Torre de Babel se passou ali. Com o advento do
Império Islâmico mais de mil anos atrás, Bagdá se tornou o grande centro
político, cultural e comercial do mundo medieval. Londres ainda era um pântano
e já existia iluminação pública na cidade dos califas. Enquanto a Europa estava
imersa na intolerância religiosa da idade média, havia liberdade religiosa para
cristãos e judeus na capital dos muçulmanos. A cultura greco-romana antiga foi
filtrada pelos árabes para reemergir na Europa do Renascimento.
Com toda esta estória rica, é lamentável ver esta
região se imergindo em outro banho de sangue, desta vez com o mundo assistindo
a tudo isto de braços cruzados, praticamente na plateia. Certamente compete aos
próprios iraquianos decidirem o que querem do seu pais, mas até que ponto o
mundo pode assistir a mais outra matança local e achar que está tudo bem? O
presidente Obama foi bem enfático em afirmar que os EUA não vão querer se
envolver e fora algum apoio de governos vizinhos, mais verbal que outra coisa,
pouco está acontecendo, pelo menos oficialmente. De qualquer forma,
interferência externa só tende a piorar as coisas, ao apoiar um lado ou outro.
Uma situação complexa em que o maior perdedor, como escrevi antes, é a
população civil indefesa.
Melhor mesmo talvez seja pensarmos no tal pênalti
(ocorreu ou não?) e nas próximas partidas da seleção.
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