domingo, 22 de junho de 2014

Nada mudou / Folha do Sul - 16.Junho.2014



Nada mudou

O noticiário agora é pesadamente colocado sobre a Copa do Mundo. A maior parte das noticias são sobre a competição. Outros fatos são postos a margem dos acontecimentos e das páginas dos jornais. Se um marciano pousasse por aqui, ele provavelmente iria se surpreender com o foco das atenções, totalmente voltados para a Copa. Seria como se mais nada estivesse ocorrendo.
Mas a verdade nua e crua é que a vida continua, na maior parte cruel e inclemente como sempre foi, planeta afora. A pior parte que se pode ver no noticiário está ocorrendo neste exato instante no Oriente Médio. Depois de muita confusão, desculpas esfarrapadas, etc, o governo americano quer ficar bem longe dos problemas do Iraque. Enquanto isso, toda uma guerra civil está a ocorrer em uma região já bastante castigada por conflitos. No Iraque, da década de 80 para cá, ocorreram guerras, invasões, rebeliões, etc. Isso sem contar com o tal envenenamento coletivo na década de 70 causado por inseticidas a base de mercúrio que tinha sido usado em sementes de trigo. Junte-se a isto governos intolerantes, conflitos religiosos, tropas de ocupação estrangeira, etc. e o que fica é uma situação de altíssima instabilidade política. O combustível desta instabilidade sendo o petróleo, do qual o Iraque tem uma grande parte das reservas mundiais.
A principal vítima de toda esta estória sem fim é a população civil que localmente parece estar vivendo em um conflito sem fim. Não importa quem está sendo vitorioso pois pouca diferença faz ser atingido pelas balas da facção A, B ou C. Na atual situação, são xiitas contra sunitas (duas correntes islâmicas). Antes era a invasão americana do Iraque, invasão iraquiana do Kuwait, retomada do Kuwait, guerra Irã-Iraque, bombardeio por armas químicas da própria população e assim por diante. Difícil não imaginarmos o que acontece fora dos jornais tais como assassinatos, estupros, órfãos abandonados, etc. A destruição da infraestrutura local deixando o pais depauperado e todo um povo a mercê dos acontecimentos.
Apenas para lembrar: foi no Iraque, que conhecemos nos livros de história como Mesopotâmia (entre rios em grego), que a civilização surgiu muito tempo atrás. O primeiro império digno do nome foi o do rei conhecido como Sargão. Abraão era desta região antes de emigrar para a Palestina. A narrativa da Torre de Babel se passou ali. Com o advento do Império Islâmico mais de mil anos atrás, Bagdá se tornou o grande centro político, cultural e comercial do mundo medieval. Londres ainda era um pântano e já existia iluminação pública na cidade dos califas. Enquanto a Europa estava imersa na intolerância religiosa da idade média, havia liberdade religiosa para cristãos e judeus na capital dos muçulmanos. A cultura greco-romana antiga foi filtrada pelos árabes para reemergir na Europa do Renascimento.
Com toda esta estória rica, é lamentável ver esta região se imergindo em outro banho de sangue, desta vez com o mundo assistindo a tudo isto de braços cruzados, praticamente na plateia. Certamente compete aos próprios iraquianos decidirem o que querem do seu pais, mas até que ponto o mundo pode assistir a mais outra matança local e achar que está tudo bem? O presidente Obama foi bem enfático em afirmar que os EUA não vão querer se envolver e fora algum apoio de governos vizinhos, mais verbal que outra coisa, pouco está acontecendo, pelo menos oficialmente. De qualquer forma, interferência externa só tende a piorar as coisas, ao apoiar um lado ou outro. Uma situação complexa em que o maior perdedor, como escrevi antes, é a população civil indefesa.
Melhor mesmo talvez seja pensarmos no tal pênalti (ocorreu ou não?) e nas próximas partidas da seleção.

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