terça-feira, 25 de junho de 2013

Vinte Centavos - Folha do Sul / 24.Junho.2013



 Vinte Centavos

Derrama! Esta palavra causaria arrepios no cidadão da colônia portuguesa na América, mais conhecida como “Terra Brasilis”. O que era a derrama? A Coroa portuguesa exigia da colônia o “quinto do rei”, ou seja, vinte por cento da produção do ouro, se esta quantidade não fosse atingido, as tropas, mais de ocupação que outra coisa, iam de casa em casa para tomar o que fosse de valor até que o valor fosse atingido. Data desta época a expressão ‘santinho do pau oco”, pois os santinhos de madeira eram usados para contrabandear o ouro em pó das “Minas Gerais”. Realmente ninguém estava muito a fim de pagar o tributo que no final era usado em Lisboa para manter os luxos da corte. O pretexto que seria usado para desencadear a Inconfidência Mineira seria exatamente uma derrama. Quando o traidor Silvério dos Reis delata os conspiradores, a primeira coisa que o Governador Geral (mais para ditador real que outra coisa) faz é suspender a derrama! Com a desmobilização popular, ele então partiu para prender os lideres e se seguiu o drama que todos estudamos na escola.
Mas algo mudou! Nunca mais ocorreu uma derrama. Os governos ditatoriais que a coroa portuguesa nos impunham aprenderam que haviam limites nos poderes que eles tinham e que não poderiam mexer demais com o povo.
Mais de dois séculos depois, temos o povo na rua, numa explosão de manifestações Brasil afora. A razão inicial não é mais uma derrama, mas um aumento no preço das passagens de ônibus. Talvez meros vinte centavos, mas na verdade o que temos é um conjunto de fatores que juntos estão levando a população a protestar, e com muita justeza. Talvez o principal é que hoje não temos mais a multidão de desinformados. A população se educou, aprendeu, está mais escolada, apesar dos esforços para mantê-la longe destas coisas! Outros fatores são o inicio de uma recessão, com o desemprego resultante. Junte-se a isso a volta da inflação e pior que tudo, a percepção de corrupção, muita corrupção nas esferas de governo. Tudo isto junto está causando a atual explosão de manifestação Brasil afora.
O cidadão brasileiro está despertando pouco a pouco que alguém paga a conta, e este alguém é ele. Para complicar a situação, o governo resolveu bancar uma copa do mundo e em seguida as Olimpíadas! Outra percepção que fica (independente se verdade ou não, com desmentido ou não do governo) é que quem paga a conta é o governo, ou seja, nossos impostos, e quem irá levar o lucro é a FIFA. Enquanto isso, Saúde, Educação e Segurança (para não falar de infraestrutura), são deixados de lado. Acintosamente a FIFA ainda chama “voluntários” para trabalharem de graça. Ou seja, nem mesmo emprego esta estória de copa do mundo irá trazer para o povão! Alguma dúvida do porque que, fora as espetaculares jogadas de Neymar, ninguém, fora os fanáticos de sempre, estão lá muito interessados nesta pré-Copa?
Retirando-se os exaltados e “baderneiros” (linguagem da Globo) de sempre, que acabam tirando parcialmente o brilho das manifestações, fica para os Governos, particularmente para o Governo Federal, o ônus de como lidar com isso. A imprensa estrangeira (vi isto na CNN) está inclusive citando a possibilidade de se cancelar a copa no Brasil. Realmente se o povo ficar hostil com o evento, tal como na derrama do Brasil Colônia, será muito complicado manter o evento.
Queira Deus que talvez agora os governantes ouçam finalmente a voz das ruas e coloquem realmente recursos nas áreas que são tanto necessárias. Não podemos ter estádios de primeiro mundo e hospitais de terceiro! Como podemos receber turistas estrangeiros se não temos uma policia preparada nem para lidar com o próprio povo? Como poderá o cidadão falar (mesmo com um inglês básico) com o turista se lhe falta escola para tal?
Esperemos que  desta vez realmente a voz que vem da rua seja ouvida pelo centro de decisões em Brasília e que possamos ter um pais melhor.

sábado, 22 de junho de 2013

"NASCIDO DAS CINZAS" - Revista Amanhã / Maio 2013



Revista Amanhã – Maio 2013

Nascido das cinzas

  
CRM: companhia pode se beneficiar do projeto que prevê o uso do carvão como matéria-prima

O carvão mineral sempre foi uma espécie de riqueza maldita do Rio Grande do Sul. Disponível em abundância, o minério pode catapultar o desenvolvimento econômico do centro do Estado, especialmente na região de Candiota. Entretanto, por ser poluente, permanece subexplorado e só entra na pauta do governo quando secam os reservatórios das hidrelétricas. A boa notícia é que já há alternativas em estudo para que o Estado consiga, finalmente, desenterrar as riquezas de Candiota – e com um impacto ambiental pequeno. Uma delas é utilizar o carvão gaúcho não só para produzir energia, mas também para extrair insumos para a indústria química. Em outras palavras, fazer de Candiota o primeiro polo carboquímico do país.

A ideia não é nova. Inspira-se no caso da cidade de Sasolburg, na África do Sul, onde o carvão há tempos é utilizado não só como fonte de energia, mas também como fonte de insumos carboquímicos. 

O projeto consiste em estruturar uma cadeia produtiva a partir da gaseificação do carvão, que gera metanol – matéria-prima de subprodutos como eteno, propeno, formaldeído e outros. Que são utilizados para fabricar desde fertilizantes até ração para bois, explica Sérgio Meth, professor da Universidade Federal do Pampa (Unipampa), idealizador do plano. “Podemos produzir entre 1 e 2 milhões de toneladas de metanol por ano”, assegura. O empreendimento também ajudaria o Brasil a reduzir as importações de ureia – atualmente, diz Meth, as compras do insumo custam US$ 1 bilhão por ano ao país. “A partir do gás carbônico presente no gás de síntese do carvão (syngas), é possível obter a ureia, que é matéria-prima de fertilizantes e ração”, pontua. “Temos linha férrea, estradas e o porto de Rio Grande para escoar a produção.”

A formação de um polo carboquímico pode dar novo alento também à indústria mineradora. Elifas Simas, presidente da Companhia Riograndense de Mineração (CRM), destaca que, hoje, o carvão responde por apenas 1,5% da energia gerada no país. “Já a Alemanha produz 45% de sua energia através do carvão, e os Estados Unidos, 41%”, compara. Ele diz que o carvão gaúcho funciona muito bem para geração, mas apresenta algumas desvantagens como a enorme quantidade de cinzas (50%) e de enxofre. Com o polo, esse problema se transformaria em uma solução. O deputado federal Afonso Hamm (PP-RS), líder da Frente Parlamentar em Defesa do Carvão Mineral Gaúcho, conta que o polo carboquímico pode beneficiar inclusive o polo petroquímico. “É possível mandar eteno e polietileno de Candiota para Triunfo. Isso otimiza o retorno financeiro”, garante.

A produção de combustíveis é outro benefício da gaseificação do carvão mineral. Sérgio Meth, da Unipampa, traz como exemplo os projetos de cerâmica, que poderiam receber a contribuição do gás de síntese. “Falta combustível para esses projetos, não argila”, argumenta. Além disso, a atividade carboquímica é menos poluente que a petroquímica, diz Meth. “Menos gás carbônico, enxofre e óxido de enxofre são liberados na atmosfera. O benefício financeiro também é maior”, conta o professor. Pelos cálculos dele, o polo carboquímico demandaria investimentos de R$ 10 bilhões a R$ 12 bilhões – mas, no longo prazo, geraria receitas de até R$ 4 bilhões anuais.

O polo carboquímico pode gerar um benefício econômico extra: a estabilidade para as empresas que exploram carvão mineral. Fernando Zancan, presidente da Associação Brasileira do Carvão Mineral (ABCM), diz que os preços do setor ainda oscilam muito. Mas se diz otimista em relação às medidas recentes anunciadas pelo governo federal. “A presidente Dilma Roussef informou que serão desonerados impostos na cadeia de fabricação de fertilizantes. É um passo fundamental”, analisa. Mas não é suficiente. Mais do que medidas paliativas, o setor demanda uma política de longo prazo. “Precisamos de uma política para o carvão mineral. Ainda não temos”, resume o deputado Afonso Hamm. Um passo nesse sentido foi dado em novembro do ano passado, quando o prefeito de Candiota, Luiz Carlos Folador, foi recepcionado pelo ministro de Ciência e Tecnologia, Mauro Antônio Raupp, em Brasília, para apresentar o projeto do polo carboquímico. Hamm acredita que a implantação dos polos carboquímicos faz parte de uma política industrial



 “Queremos uma política energética sustentável – que envolva eficiência econômica, compatibilidade ambiental e segurança de suprimentos”


 “Na China, o plástico é produzido com carvão e não com petróleo”, exemplifica.
A pleno vapor, o polo carboquímico pode ampliar também a capacidade energética do Rio Grande do Sul. Sergio Meth conta que o gás de síntese pode ser usado como combustível para mover turbinas. “Os gases quentes aquecem uma caldeira que, finalmente, gera energia elétrica”, resume. O processo, diz ele, é chamado de “Ciclo Integrado de Gaseificação”, ou IGCC, na sigla em inglês. “As termoelétricas são importantes, mas também precisamos dos polos carboquímicos”, destaca.
Apesar do otimismo, Fernando Zancan, da ABCM, considera a implantação de novas políticas para o carvão mineral um desafio. “O carvão mineral ainda é desconhecido no país, apesar de ser o recurso mais abundante”, lamenta. Segundo ele, o minério não pode ser excluído das estratégias de desenvolvimento energético do país – que ainda carece de estabilidade. “Esses dias passei em frente ao Parque Eólico de Osório e as hélices estavam paradas. Não podemos depender do vento”, sustenta. Em relação ao polo carboquímico, Zancan acredita que o Rio Grande do Sul deve buscar tecnologia em países que já se desenvolveram na área, como é o caso da China. “Precisamos ir à China para entender o modelo de negócios deles”, pontua Zancan.

Outra referência é a Alemanha. No ano passado, o país europeu implantou 2.800 megawatts em geração de energia através do carvão. “Neste ano, foram mais 5,5 mil e, em 2014, serão mais 2,2 mil”, atesta. No Brasil, porém, o setor se desenvolve a passos lentos e ainda depende muito da realização de leilões de contratação de energia por parte do governo federal – o próximo deverá ocorrer em agosto deste ano.

 Exemplo estrangeiro
 
O funcionamento de um polo carboquímico é relativamente simples. De acordo com Sérgio Meth, consiste na construção de um reator que, além do carvão, utiliza oxigênio, água e areia. “Esta mistura fica flutuando dentro do reator para gerar o gás de síntese (syngas)”, explica. O projeto de Candiota, diz ele, poderia abrir mão de água e areia na estação. Isso porque o carvão depositado nas reservas do sul do Brasil já possui água. “A própria cinza do carvão, que costuma dar problemas na queima, contém água”, conta. Nesse processo, a obtenção de enxofre, produto importado pelo governo brasileiro, também aparece como benefício. Meth relata que a substância gera ácido sulfúrico para a produção de fertilizantes. “É o mesmo processo utilizado pela Petrobras para tirar enxofre das correntes de petróleo”. É também uma esperança para que o Rio Grande do Sul consiga explorar o carvão com menos impactos ambientais.