Material versus Espiritual
É sempre bom procurar ver os movimentos sociais e
as escolas de pensamento dentro de um contexto histórico amplo. No período
histórico conhecido como Idade Média, temos uma predominância ideológica
voltada para o espírito. As razões para isso são claras: uma sociedade na maior
parte analfabeta, muita pobreza e média de vida muito curta. Um bom filme sobre
o assunto é “O Nome da Rosa” com Sean Connery.
Com o advento das Grandes Navegações, Descoberta do
Caminho das Índias, Descoberta da América e a subsequente Revolução Comercial,
todo um contexto muda. Mais riqueza circula, e a base da sociedade feudal
começa a ser corroída. Seguem-se no rastro do debate ideológico, a Reforma e a
Contra-Reforma, que geraram guerras ao longo dos séculos 16 e 17, até que por fim
com o acordo conhecido como Paz de Westfália (1648) tem-se o fim de conflitos
na Europa devido a divergências religiosas. Toda uma mudança de pensamento
ocorreu neste período. Um mundo mais materialista começava a dar seus passos.
Hoje, depois de toda uma caminhada histórica,
incluindo a já citada Revolução Comercial, Revolução Industrial, conflitos
ideológicos (principalmente comunismo versus capitalismo), avanços
tecnológicos, etc, desembocamos numa sociedade altamente voltada para os bens
materiais onde o importante é o agora e onde tudo é descartável. Muitas vezes
nos esquecemos de que dinheiro resolve apenas problemas imediatos, e que muitas
vezes não basta apenas dinheiro para alcançarmos a tão sonhada felicidade.
Temos tanto orgulho de nossa posição hodierna que nos esquecemos que somos
seres falíveis e que muito embora realmente tenhamos uma vida bem mais longa
que nossos antepassados, esta continua a ter uma duração limitada.
Temos hoje no mundo todo um renascimento religioso
de raízes ligadas a este problema. Muitas pessoas se sentem desencantadas com a
vida moderna e querem uma saída espiritual para problemas de ordem pessoal que
dinheiro não conseguiria a principio resolver. Poderíamos dizer que todo um
refluxo de ideias está ocorrendo. Novos princípios baseados em uma visão sobre
conceitos muito antigos parecem estar cada vez mais presentes ao mesmo tempo
que uma reflexão sobre isto é feita. A busca moderna pela religião é justamente
na nossa valorização como seres humanos e pelo respeito que devemos ter uns com
os outros. Uma posição de maior humildade frente a problemas existenciais
muitas vezes difíceis.
Interessante notar que um conceito muitas vezes
incompreendido é o de humildade. Humildade no sentido de se sentir um ser
limitado. Ao reconhecermos nossas limitações talvez estejamos dando um grande e
imenso passo para nos tornarmos seres humanos melhores, pelo menos no plano
espiritual, com óbvias repercussões no plano material. Em outras palavras,
sairíamos da necessidade total pelo dinheiro e coisas materiais e teríamos pelo
menos um aprimoramento da nossa capacidade espiritual.
Qual será o desemboca douro destas novas
tendências? Na verdade elas existem desde o inicio da Revolução Industrial, 200
anos atrás. Recomendo o livro “A Era das Revoluções” de Eric Hobsbawn onde
existe um capitulo dedicado especialmente a este tema. Certamente a necessidade
espiritual de um ser humano moderno cheio de riquezas mas com um vazio pessoal
tornam estas mudanças muito necessárias. Duzentos anos depois pode-se ver que
esta procura continua a ser uma necessidade por parte de pessoas que não
conseguem ser felizes apenas com a satisfação das suas necessidades materiais
imediatas.
O que nos espera? Neste momento saímos da claridade
do presente e entramos na escuridão do futuro. Dedico este pequeno texto
aqueles que através da religião buscam ser, independente da crença, uma luz em
um mundo em que muitas vezes estamos imersos em escuridão moral e espiritual.
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