segunda-feira, 29 de setembro de 2014

Limite da Apelação / Folha do Sul - 22.Setembro.2014



Limite da Apelação

Com o advento da midia televisiva, toda uma mudança de hábitos ocorreu em amplas faixas da população. Setenta anos atrás a reunião da família após o jantar seria em torno do radio para escutar o noticiario ou algum outro programa. A televisão possibilitou não só a comunicação através de sons como também através de imagens vivas para a grande massa, algo nunca antes ocorrido na história humana. Desde então até o advento da internet, o reinado da televisão como opção de lazer para as pessoas foi imbatível. Pouco a pouco foram tomados espaços do radio e mesmo do cinema. Aspectos culturais passaram a ser disseminados por amplas faixas da população que relegaram outras formas de entretenimento ao segundo plano. Um filme interessante que retrata muito bem esta transformação é “Bye bye Brasil” com o saudoso José Wilker, onde uma tropé de circo descobre que a invasão das “espinhas de peixe” (antenas de televisão) nos telhados de uma cidade é sinal de que terão pouca platéia na localidade.
As grandes redes acabaram tendo o monopólio por décadas até que com a internet, tv a cabo e equipamentos mais acessíveis, pouco a pouco vão aparecendo outras opções, num espectro amplo que vai desde programas religiosos até canais com conteúdo digamos mais “picante”, tendo assim o telespectador a liberdade de escolha de que programa lhe interessa. Novas opções de entretenimento terminaram com a falta de alternativas nos domingos onde muitas vezes a única opção era ligar a televisão e ver algum programa de auditório ou um ou outro enlatado.
Escrevo estas linhas deixando bem claro que não sou o tipo do cidadão televisivo (me refiro a tv convencional). Gosto de ver o jornal da manhã e alguns programas do tipo educativo ou informativo. Acho inclusive que o pessoal das emissoras busca dar ao público o melhor em termos de informação e jornalismo com mais realismo e neutralidade que alguns setores políticos gostariam de reconhecer que acontece.
Lamentavelmente para se segurar a audiência, que tende a buscar outras opções, muitas vezes programas são feitos com conteúdo apelativo, e esta apelação tem muitas vezes o efeito bumerang de afastar uma boa parte dos telespectadores. Cenas picantes, certamente não são o melhor prato para a hora que a familia inteira está reunida na sala de estar. Quando me refiro a familia, quero incluir não apenas os adultos, mas também crianças, adolescentes e idosos. Certamente não é a coisa mais agradavel ver cenas de sexo ou quase na hora do jantar quando todos estão reunidos.
O efeito que acaba ocorrendo, portanto, é o de muitas pessoas preferirem buscar outras opções e algumas inclusive preferem nem ter tv em casa. Recentemente, por temor à queda de audiência, uma novela do horário nobre teve a suas cenas “picantes” minimizadas. Esta noticia estava na internet e é interessante que tenha ocorrido sem nenhuma necessidade de “censura oficial”. Certamente se queremos ter liberdade de expressão no pleno sentido da palavra, contos eróticos e correlatos tem o seu canal de expressão mas certamente se espera ver algo mais leve no horario nobre. Talvez uma “fronteira” tenha sido atingida sem necessidade de demarcação, algo tão natural como um fenomêno geográfico tal como um rio ou lago.
Alias a tão decantada liberdade de expressão vem com o natural limite de que não se deve ferir o direito de terceiros, conceito legal dos mais básicos, a não ser, é claro, que ocorra a descrição de fatos acompanhados de provas concretas. Muito preocupante é o uso de estereótipos para exatamente atrair audiência. Querer colocar que esta ou aquela característica, principalmente as que podem ser interpretadas como negativas, são por causa de raça, classe social, crença religiosa ou etnia cultural, é no mínimo absurdo e pior, denota uma total falta de tato com as pessoas e a comunidade. Uma serie recente, com um nome que parece ter sido tirado de algum conto de literatura de terceira,  acabou tendo como resultado protestos e a entrada da rede de televisão sendo pixada no meio da confusão, seguindo-se o debate na net se tanto a serie como os protestos teriam cabimento. Provavelmente isto tudo era previsível e o melhor seria talvez uma estória sem exploração de estereótipos nem com conotações que beiram o preconceito, pelo menos no nome.

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