segunda-feira, 12 de agosto de 2013

Infância Perdida - Folha do Sul / 12.Agosto.2013



 Infância Perdida

Um dos meus filmes favoritos é “Out of Africa” com Meryl Streep e Robert Redford. Não sei por que motivo colocaram o nome em portugues de “Entre dois amores”?! Uma das cenas mais interessantes é aquela em que a Meryl, no papel da fazendeira, resolve fundar uma escola para as crianças filhas dos trabalhadores. O chefe da tribo impõe que apenas crianças com altura menor que a roda de uma carroça poderão lá estudar. A fazendeira não entende e ele explica que desta forma ninguém irá desafia-lo enquanto ele estiver vivo. Em outras palavras, ele tem plena consciência do papel de micro ditador e que pretende manter esta situação o mais que possível.
Exploração infantil, trabalho escravo com o uso de crianças, isto é tão velho quanto o ser humano. Crianças sempre foram usadas em trabalhos degradantes, muitas vezes com a anuência dos pais. A Revolução Industrial, desde o Século 18 apenas agravou um quadro já bem complicado que só iria começar a sofrer alguma mudança em meados do Século 20. Mesmo nos Estados Unidos, na época da Grande Depressão (anos 1930), temos relatos de uso de crianças em fábricas.
Aqui no Brasil, de umas décadas para cá, tivemos progressos, mas muito ainda precisa ser feito. Desde o Brasil Colônia que temos o uso abusivo de crianças nas mais diversas areas de produção e sempre em trabalhos repetitivos e extenuantes. O emprego de crianças para se produzir carvão vegetal e no descascamento da castanha de caju não são fatos novos. O que choca é que esta prática ainda exista no pais.
Antes de mais nada, lugar de criança é na Escola. Digo Escola com letra maiuscula, com professores gabaritados e dignamente pagos. Existem paises no mundo em que é lei que uma criança tenha que ir para a escola. Não digo “lei letra morta” e sim a que é cumprida com todos os rigores. Precisamos entender que uma criança fora da escola é um cidadão que em 10, 15 anos, será mais um elemento não qualificado para o mercado de trabalho. Ou o que é pior, na porta do mundo do crime. A criança que vemos nos sinais, principalmente nas grandes capitais, são candidatos certos para criminalidade ou prostituição. Onde estão as autoridades constituidas quando vemos crianças mendigando muitas vezes com alguem adulto sendo o responsavel por tais práticas?
Mas a pergunta que fica é quem é que lucra com esta situação? Tal e qual na situação do filme, acabamos por entrar numa armadilha histórica. O dono do “negócio”, seja uma carvoaria, uma fábrica de castanhas de caju, uma pedreira, etc, não vai ter interesse em modernizar o seu negócio se ele tem uma opção barata e fácil. Simplesmente ele continua do jeito que está. Para que mudar?
A solução é muito simples! Escola para a gurizada, penalidades da lei para aqueles que empregarem crianças, digo isto incluindo os responsaveis pelos menores. Muito foi feito no Brasil, mas certamente muito precisa ser feito.  A maior riqueza de uma nação está exatamente no seu povo e é nele que tem que serem feitos os maiores investimentos. Temos que ter um jurídico cada vez mais rigoroso neste item, infraestrutura adequada (escolas de qualidade), e professores motivados e bem pagos. Por maior que seja o custo, será este investimento que irá nos trazer o retorno de termos um pais definitivamente nos trilhos. Outros paises fizeram isso: investimento no ensino básico e fundamental. Um dos mais recentes vem da Coréia do Sul. Devastada pela guerra meio século atrás, entre outras coisas, foram feitos investimentos enormes em educação, em todos os niveis. Hoje a Coréia do Sul desponta como uma potência de ponta internacionalmentel. Produtos “made in Coréia” se tornaram comuns e o Indice de Desenvolvimento Humano é dos maiores.
Um Brasil cada vez melhor, esta é a nossa intenção. Precisamos fazer com que os “ditadores da aldeia” parem de querer bloquear o nosso desenvolvimento social e que todas as crianças, do Oiapoque ao Chui estejam no lugar que lhes cabe, e este lugar é na Escola e não em alguma cabana fétida ou estrada empoeirada fazendo trabalho de adultos ou o que é pior, de máquinas.

Um comentário:

  1. Ao buscar informações sobre escolas em Bagé me deparei com seu texto - que, por sinal, adorei! Mas tenho precauções quanto ao endeusamento da Coreia do Sul (até o presidente Obama mencionou algo a respeito, não é mesmo?). Falo como professora, como professora que trabalhou com os diferentes níveis de ensino em nosso país e, especialmente, como mãe (que deseja o melhor para seus filhos, of course). O respeito dado à educação pelos coreanos é ímpar – mas ele traz junto a si um caráter obsessivo que pode aniquilar a infância e/ou a adolescência.
    O que pude observar na última década é que os melhores resultados escolares se dão quando há um envolvimento familiar com o processo educacional. Conheço famílias várias (de classe média) para as quais não faz o menor sentido comprar livros ou proporcionar cultura, que jamais perguntam ao filho como foi seu dia na escola. Educação, para estas pessoas, é “despesa” – não é encarada como investimento. Imaginemos, então, como funciona a questão escolar em uma família que não possui as condições mínimas de sobrevivência que garantam sua dignidade!
    Quanto ao trabalho escravo infantil - que tira nossos pequenos do ambiente educacional – é assustador saber que o mesmo continua existindo aos borbotões em nossas cidades. Me refiro especialmente àquelas crianças que perdem a infância (e a escola) presas (muitas vezes literalmente) em casa, cuidando de irmãos menores.
    Nossa realidade faz com que muitos de nós achemos “normal” o que, em verdade, é chocante. Não é normal criança fora da escola. Não é normal trabalho infantil. Não é normal falta de condições materiais no ambiente escolar. Não é normal profissionais desqualificados e malíssimamente pagos. Não, não é normal – e isso me arrasa como brasileira e como ser humano. Porque eu, assim como você, desejo um país cada vez melhor – para todos.

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