Onde fica a fronteira?
O atentado em Paris e suas
repercussões estão sendo o grande centro das atenções no mundo todo. No meio de
muita comoção se faz necessário isolar cada detalhe e tentar uma reflexão sobre
o que realmente está acontecendo.
O atentado, ato terrorista, crime,
etc, dê o nome que quiser para o que aconteceu, foi na realidade o assassinato
de 12 pessoas (mais onze feridos) que trabalhavam em uma revista satírica em
que eram publicadas charges que entre outros temas satirizavam símbolos
religiosos. Seguiu-se uma perseguição policial em que ocorreram sequestros e
mais mortes, incluindo dos supostos terroristas. Em todo o mundo tivemos
manifestações contra o atentado e algumas de apoio ao mesmo, ou pelo menos
condenando o que chamaram de “brutalidade policial”. No meio de tanta
informação, estas partes foram possíveis de extrair sem correr o risco de
exageros.
Os assassinatos em si, com toda a
brutalidade que os cercam, não deixam de ser um fato corriqueiro em um mundo no
qual já nos acostumamos a escutar no noticiário dezenas, centenas de pessoas
serem mortas todos os dias em conflitos que parecem não ter fim. Se alguém
duvida do que digo, basta abrir as páginas policiais de qualquer jornal
brasileiro. Temos uma situação séria mesmo no nosso próprio pais. Então, por
mais importantes que fossem os jornalistas, não é este o fato central aqui.
A atitude da policia francesa de
buscar os perpetradores é a atitude que se espera desta instituição. A policia
é paga exatamente para isso e um estado por ser democrático, não significa que
tem que ser fraco. Até prova em contrario, a policia agiu dentro do que se
esperava da mesma. Pessoas que cometem delitos, seja de que ordem forem,
inclusive os de natureza política, devem estar preparadas para as
consequências. Novamente não é este o foco e podemos deixar de lado a atitude
policial.
A atitude dos sujeitos que cometeram
o atentado foi por causa da satirização de símbolos religiosos. Qual o símbolo
e qual religião? Será este o ponto? Ou será que deveríamos ver até que ponto se
pode transgredir da liberdade de expressão e até que ponto, e como, pode-se ter
uma reação contra estas transgressões. Mas ai entramos em uma zona cinzenta,
não delimitada. Temos tido a atitude de permitir uma total liberdade de
expressão, pelo menos nos países democráticos, com a salvaguarda dos direitos
individuais e das instituições. Em outras palavras, todo mundo é livre para se
manifestar, mas se houver abusos, como difamação e calúnia, a Justiça poderá
ser acionada. No caso de símbolos religiosos, isto se torna terreno cheio de
armadilhas.
A atitude de extremistas também não
ajuda em nada, servindo apenas para radicalizar um debate que deveria ser muito
mais sadio. Por vezes, lendo os comentários internet a fora, parece que estamos
voltando ao tempo das cruzadas, em que a cristandade se chocou contra o mundo
islâmico. Todo o desenvolvimento ao longo do Renascimento, Iluminismo, etc
parece ter sido jogado na lata do lixo pelo teor destes comentários.
Estamos portanto em terreno
desconhecido. Isto não é de agora. Qual o limite para a liberdade de expressão?
Será possível termos tal limite? Quem iria marcar esta fronteira? O estado
laico, a Igreja, alguma ONG? A resposta a isso tem sido, desde as Revoluções
Americana e Francesa, mais de duzentos anos atrás, a ausência de toda e
qualquer censura. Dentro desta filosofia, qualquer restrição à liberdade de
imprensa, por menor que seja, é interpretada como um atentado às liberdades
democráticas de livre pensamento e crítica.
O atentado em Paris nos atinge em
cheio nestas liberdades. Pior, ao invés de termos um debate sadio sobre este
tema, acabamos perdendo o foco. Poderíamos dizer que sem o debate, terminamos
jogando fora a água do banho junto com o bebê.
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