segunda-feira, 4 de agosto de 2014

Um Brasileiro / Folha do Sul - 4.Agosto.2014


Um Brasileiro

Espíritos fortes e livres assustam! Muitas vezes ao denunciarem a injustiça são execrados, denunciados e difamados. O mais contraditório é que o elemento mais assustado é sempre o mais fraco e o injustiçado. Mudanças são sempre difíceis. Em um Brasil que prima pelo conservadorismo há mais de 5 séculos, a simples sugestão de mudanças já causa arrepios na maioria. A inércia, muitas vezes anacrônica, na sociedade brasileira tem sido historicamente um anátema difícil de quebrar. Aqueles que por idealismo, ou porque simplesmente tem a visão que a realidade poderia ser diferente, lutam por mudanças, espíritos livres que são, e acabam tendo que se bater de frente com este conservadorismo rancoroso e retrógrado que nos rodeia.
Nascido em Montes Claros, Minas Gerais em 1922, em um Brasil essencialmente rural, dominado pela aristocracia “café com leite”, Darcy Ribeiro iria ao longo dos próximos 75 anos, até seu falecimento em 1997, acompanhar e fazer parte dos capítulos dramáticos de mudança da sociedade brasileira. Seria um dos espíritos fortes e livres, um daqueles elementos incomodadores da ordem existente, capaz de provocar temor e esperança ao mesmo tempo.
Formado em antropologia, acabaria se destacando não só na sua área específica, mas também como educador, escritor e político. Seus primeiros trabalhos, onde se destaca, são entre os índios de um Brasil ainda “selvagem” e intocado. Seus trabalhos são referência para uma compreensão melhor desta parte da sociedade brasileira, tão espezinhada, massacrada e escravizada ao longo destes 5 séculos. É de sua autoria o projeto do Parque Indígena do Xingu, que acabou se tornando realidade em 1961.
Ajudou na criação da Universidade de Brasília no inicio dos anos 60 e foi também seu primeiro reitor. Foi ministro da educação e chefe da Casa Civil no Governo do Presidente João Goulart. Como tantos intelectuais de posições firmes e fortes, teve seus direitos políticos cassados e por fim teve que se exilar. Ao fim da ditadura, retornou ao Brasil e se elegeu vice-governador do Rio de Janeiro no primeiro governo de Leonel Brizola (1983-1987), quando supervisionou em todas as etapas, a implantação dos Brizolões (ou CIEPs – Centros Integrados de Ensino Público), uma ideia inovadora, por fornecer educação de forma ampla para parcelas consideráveis da população, em que as maiores reações contrarias vinham, como sempre, da elite retrógrada, acostumada a se nutrir da miséria e ignorância do povo. Muito embora a ideia original viesse de Anísio Teixeira, foi o Senhor Darcy que levaria este projeto para a frente no Rio de Janeiro. No segundo mandato de Brizola no Rio de Janeiro, recebeu a incumbência de coordenar a instalação da Universidade Estadual do Norte Fluminense - UENF. Trazendo  (e preservando nela) cientistas e pesquisadores importantes fez da UENF uma das mais importantes instituições no cenário acadêmico brasileiro.
Honrarias e reconhecimento nunca lhe faltaram, para desespero da ala conservadora. Terminou seus dias, após muitos anos de combate ao câncer, como senador da república. Deixou como legado livros e ideias, para um Brasil que ele sempre sonhou mais justo e mais livre, mais para os brasileiros e sem o anacronismo do atraso.
Uma das suas frases mais famosas foi: “Fracassei em tudo o que tentei na vida. Tentei alfabetizar as crianças brasileiras, não consegui. Tentei salvar os índios, não consegui. Tentei fazer uma universidade séria e fracassei. Tentei fazer o Brasil desenvolver-se autonomamente e fracassei. Mas os fracassos são minhas vitórias. Eu detestaria estar no lugar de quem me venceu.” Apenas não concordo com o Professor Darcy no que se refere aos fracassos. Aqueles que momentaneamente venceram, não tinham as ideias com a mesma força e permanência. Ao contrario, a mensagem do Professor e Antropólogo Darcy Ribeiro é eterna e será sempre o principal legado para as gerações vindouras.

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