segunda-feira, 11 de agosto de 2014

O Cala Boca / Folha do Sul - 11.Agosto.2014



O Cala Boca

Retiro esta do dicionário on-line de português: “Censura s.f. Exame crítico de obras literárias ou artísticas; exame de livros e peças teatrais, jornais etc., feito antes da publicação, por agentes do poder público”. A palavra é de origem latina onde o censor seria o elemento encarregado de aplicar a mesma. A censura seria assim uma maneira de coibir a liberdade de expressão e assim limitar a difusão do conhecimento através de uma determinada comunidade. Normalmente este tipo de coibição é utilizado por regimes ditatoriais, mas dependendo do nível de democracia de um determinado pais, formas de censura, muitas vezes camufladas, podem estar presentes.
As consequências a nível histórico são por demais conhecidas pois a falta de informação leva uma massa humana ficar subordinada aos desígnios dos poderosos, sem conhecimento dos seus direitos, muitas vezes básicos. O acesso à informação produz um povo consciente e informado e isso tira poder dos controladores de decisão que precisam minimamente prestar algum tipo de contas para a população.
A ditadura brasileira durou 20 anos e usou e abusou da censura. Sem internet e com facilidade de controle dos meios de comunicação existentes (rádio, tv, jornais, etc), foi muito fácil determinar o que poderia ou não ser de conhecimento do público. Os órgãos de comunicação eram monitorados de perto pelo “Conselho Superior de Censura” e ai de quem não ficasse na linha. Artistas foram particularmente visados e acabaram indo ou para a prisão ou para o exílio. Nomes que incluem Caetano Veloso, Elis Regina, Milton Nascimento, Chico Buarque, etc. Até mesmo Sófocles (autor grego da antiquidade) esteve sob a mira da tesoura, e teria ido mesmo em cana não tivesse morrido em 406 a.C. por causa da sua peça Édipo Rei. Com o passar do tempo, o caráter cada vez mais ridículo desta forma de arbítrio aumentava. Um dos casos mais hilários ocorreu com o Sr. Nelson Silva, redator chefe da revista Veja que entrou numa sala de embarque carregando o livro “Trotski, o Profeta Armado”. Ao ser abordado por um censor, tomou um susto e  pensou que iria certamente em cana, mas o censor ao olhar o livro apenas disse que também era religioso...
A necessidade de vigilância sobre o sistema, não sobre os cidadãos, é vital para que possamos manter a integridade e a civilidade na nossa sociedade. O fim da censura nos anos 80 não quer dizer que não possa existir um retorno da mesma disfarçada de inúmeras formas. Censuras ditas judiciais como a que se abateu sobre o jornal “O Estado de São Paulo” quando da denúncia (junho 2009) de que o mordomo de Roseana Sarney seria empregado do Senado com salário de 12.000 reais são uma prova de que, de formas ainda que vagas e escondidas, ainda estamos com uma censura, talvez mais leve, mas censura. Aqueles que detém o poder sempre vão estar na tentação de querer encobrir os fatos negativos que possam ser deletérios para a sua imagem, por piores que sejam as consequências. Quando estas acontecem, o padrão dos donos do poder é dizer “que nada sabiam”.
A liberdade de expressão é garantia constitucional mas na prática muitas pessoas tem medo de externar a sua opinião por temor a represálias e mesmo para jornalistas tarimbados é muitas vezes necessária coragem para expor a verdade. Um exemplo da magnitude disto pode ser medido por quantas tragédias não poderiam ter sido evitadas (desastre em Congonhas, incêndio da Boate Kiss, etc) se a verdade tivesse sido externada antes. De nada adianta a presença de políticos que aparecem somente depois que os fatos ocorreram para reconfortar as famílias das vítimas. De que adianta termos processos e mais processos para encontrar culpados se o sistema se mantém basicamente o mesmo e pronto para agarrar novas vítimas.
A verdade é que governos não gostam de ser cobrados, e no final a principal vítima da censura, disfarçada ou institucional, acaba sendo a própria sociedade que se auto impõe esta forma de controle.

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